Sermo in VII dominica post Pentecosten

Bethlehem a Brasilia, 19 julii A.D. 2020

Por Pe. Ivan Chudzik, IBP.

Onde estão os falsos profetas?Enquanto os combatemos fora de nossos lares, eles já estão dentro

Ave Maria.

Divino Menino Jesus.

Nossa Senhora do Carmo.

São José.

Santo Antônio de Lisboa.

Caros fiéis, Nosso Senhor diz no Evangelho que ouvimos: “Guardai-vos dos falsos profetas. Eles vêm a vós disfarçados de ovelhas, mas por dentro são lobos arrebatadores.” (Mt. VII, 15) A ação dos falsos profetas inquietou particularmente os católicos durante o período de quarentena, porque muitos temeram que o confinamento social não passasse de uma estratégia para aumentar o domínio das elites globalistas sobre a população. Enquanto alguns católicos criticavam, em suas redes sociais, a arbitrariedade e os exageros de certas medidas sanitárias, mostrando-se frequentemente destemidos diante da peste, por outro lado, temiam e difundiam o temor a respeito da instauração de um governo global totalitário. As especulações sobre o fim do mundo, portanto, aumentaram, e muitos católicos temeram a vinda dos falsos profetas assim como a do Anticristo.

Mas enquanto tantos católicos esperavam temerosos a vinda iminente dos falsos profetas, do Anticristo e a instauração de um governo global iníquo, enquanto tantos católicos ainda lêem e se dedicam a desvendar todas nuances do globalismo e do comunismo, o demônio invade, o demônio age, o demônio causa grandes estragos quase sem ser percebido. Afinal, caros fiéis, enquanto tantos católicos se inquietam com males de grandes proporções, com desastres políticos, econômicos e militares, por outro lado, não se preocupam, não vigiam, não percebem o quanto pelo celular, pela televisão e pelo cinema, o quanto por meio de vídeos ocasionais, séries, novelas e filmes o demônio pode corromper a nossa alma. Enquanto tantos católicos aguardam o dia em que um policial, a mando do Estado, invadirá a sua casa para roubar a sua liberdade, é preciso reconhecer, caros fiéis, que a nossa liberdade já foi roubada pela escravidão de certos entretenimentos, que a nossa inteligência já está “vendida”, de certo modo, para certas modas, para certos princípios, para um certo modo de vida que reflete bem o mesmo globalismo que pretendemos combater apenas politicamente.

Como bem ensina o Papa Pio XII ao tratar da missão da imprensa: “O perigo das más leituras é antes, sob alguns aspectos, mais funesto que o das más companhias, porque sabe tornar-se mais traiçoeiramente familiar. Quantas crianças ou jovens, sós, nos próprios quartos, com pequenos livros em voga, deixaram que tais livros lhes disessem cruamente coisas que não permitiriam a outros murmurar sequer em suas presenças, ou deixaram que se descrevessem cenas das quais não quereriam por nenhuma coisa do mundo ser promotores ou vítimas! […] Outros, cristãos e cristãs, que desde sua infância caminharam pelas vias retas, gemem depois pelo improviso aumentar das tentações que a oprimem e diante das quais se sentem sempre mais débeis. Talvez se interrogassem sinceramente a sua consciência, deveriam reconhecer que leram um romance sensual, desfolharam uma revista imoral, fixaram o olhar sobre ilustrações inconvenientes!”

O que ensina Pio XII a respeito das más leituras na década de 1950 é ainda mais verdadeiro quando aplicamos o seu argumento ao celular. O celular é ainda mais traiçoeiramente familiar do que um livro lido na solidão do quarto, porque do celular não nos separamos praticamente em momento algum do dia; e a iniquidade presente em certos conteúdos de celular permanece oculta aos outros, diferentemente de um livro, cujo mau conteúdo já está manifesto em sua capa. Enquanto um livro mau não pode ser convertido em bom livro—porque o que está impresso não pode ser modificado—, o celular, por sua vez, é uma companhia ambígua, traiçoeira, porque pode armazenar conteúdos católicos e ser usado eventualmente para um fim perverso. Seja nos conteúdos, seja nas publicidades, seja naquilo que foi premeditado ou que apareceu de improviso, o celular é uma companhia traiçoeira e perigosa, cujo uso engana mesmo os prudentes e piedosos.

Na mesma mensagem, Pio XII continua: “Por vezes acontece que pais cristãos, que usaram muitas cautelas para a educação do filho ou de uma filha, que os conservaram longe dos prazeres perigosos e das perversas companhias, vejam-nos de um momento para outro, na idade dos dezoito ou dos vinte anos, tornarem-se vítimas de miseráveis e até escandalosas quedas […]. Quem foi o ‘inimigo’ que fez semelhante mal? No mesmo lar, naquele pequeno paraíso, o tentador, o astuto furtivamente se introduziu e encontrou ali, já preparado para oferecer àquelas mãos o fruto sedutor e corrompedor: um livro descuidadamente esquecido sobre a escrivaninha do pai, que minou no filho a fé do batismo; um romance esquecido sobre o sofá, ou sobre a lareira, pela mãe,  ofuscou na filha a pureza de sua primeira comunhão.” O que Pio XII dizia a respeito dos livros, podemos perfeitamente aplicar aos vídeos, às novelas e filmes que os pais imprudentemente deixam as crianças assistir, seja no celular, seja na televisão. Portanto, caros fiéis, o globalismo já penetrou as nossas casas, os falsos profetas já seduziram a nossa inteligência e o Anticristo já destronou Nosso Senhor em nossas famílias diversas vezes, porque nós consumimos todos os dias, várias vezes ao dia, um entretenimento fabricado para sufocar a caridade em nossas almas.

Para que não haja dúvidas neste ponto, é preciso compreender, caros fiéis, que os entretenimentos que assistimos no celular, na televisão e eventualmente no cinema, não são apenas meios de recreação, de descanso e de lazer. Como ensina o Papa Pio XII na encíclica Miranda prorsus, o cinema, o rádio e a televisão, e no nosso tempo o celular “[…] constituem verdadeira e própria transmissão de valores humanos sobretudo espirituais […]”. Não devemos nos iludir que nos vídeos, séries, novelas e filmes que eventualmente assistimos, se tomamos certas cautelas para evitar graves cenas contra a virtude da pureza, que tais produções não oferecem grandes obstáculos para a vida espiritual. É uma ilusão julgar que o único perigo que devemos evitar são as graves cenas contra a virtude da pureza. Afinal, tais produções são verdadeiros meios de difusão de uma certa mentalidade sob a forma da ficção e do romance, e assim os católicos se deixam sutilmente moldar por uma mentalidade liberal, relativista e mundana não porque leram os princípios do liberalismo, do marxismo ou de qualquer outra ideologia perversa, mas porque consomem diariamente pequenas doses do veneno do liberalismo através de vídeos, séries, novelas ou filmes.

Na verdade, os filmes conseguem produzir um efeito mais nefasto do que os livros. Como ensina o Papa Pio XI na encíclica Vigilanti cura: “O poder do cinema—e aqui podemos incluir as séries e as novelas—provém de que ele fala por meio da imagem, que a inteligência recebe com alegria e sem esforço, mesmo se tratando de uma alma rude e primitiva, desprovida de capacidade ou ao menos do desejo de fazer esforço para a abstração e a dedução que acompanha o raciocínio. Para a leitura e audição, sempre se requer atenção e um esforço mental que, no espetáculo cinematográfico, é substituído pelo prazer continuado, resultante da sucessão de figuras concretas. No cinema falado, este poder atua ainda com maior força, porque a interpretação dos fatos se torna muito fácil e a música ajunta um novo encanto à ação dramática. Se […] se acrescentam danças e variedades, as paixões recebem excitações das mais perigosas, que avultam vertiginosamente.” As produções cinematográficas, portanto, são mais perigosas porque assistir uma série, uma novela ou um filme não exige esforço intelectual, diferentemente da leitura; pelo contrário, existe um “prazer continuado” que inebria a inteligência e a faz aceitar quase sem perceber a mentalidade liberal presente no enredo da produção.

Isso significa, caros fiéis, que devemos ser mais criteriosos nos filmes que assistimos. Não basta evitar as produções que contenham graves cenas contra a virtude da pureza. Se uma série ou filme possui, por exemplo, um personagem que se diz homossexual, na medida em que o personagem é representado como alguém honesto, inteligente, bom amigo ou simplesmente alguém engraçado, a boa representação do ator unida às qualidades do personagem pouco a pouco criarão uma situação de complacência, de cumplicidade entre a produção e o público. Os católicos que assistem tal série ou filme, ainda que reprovem o pecado contra a natureza enquanto tal, terminam por tolerá-lo na medida em que criam simpatia pelo personagem, por seus trejeitos e costumes. A ficção, portanto, caros fiéis, é o primeiro passo para que mesmo os católicos convictos percam o horror pelo pecado, porque a exposição às cenas de pecado sufoca aos poucos a caridade. Sem horror ao pecado, ou melhor, estando a alma paralisada e sufocada pela tibieza, o próximo passo é que os próprios católicos caiam em diversos pecados que primeiramente foram assistidos, para em seguida serem cometidos.

Ademais, de nada adiantaria os católicos defenderem as más produções cinematográficas enquanto obras de arte, fazendo abstração das imoralidades que contém, porque como ensina Pio XII na encíclica Miranda prorsus: “São portando condenáveis todos os que pensam e afirmam que se pode usar, estimar e louvar determinada forma de difusão, mesmo que falte gravemente à ordem moral, contanto que encerre valor artístico e técnico.” Uma arte imoral, que provoca as paixões e perverte a inteligência, já não pode ser chamada de arte, ainda que conserve uma certa técnica de produção. Assim como um ladrão pode fazer uso de uma certa arte para realizar o seu crime sem pagar as consequências, o seu roubo permanece um ato criminoso ainda que tenha sido executado com ingeniosidade. A arte imoral, portanto, não é arte propriamente.

Por fim, pode ocorrer que uma certa produção cinematográfica não contenha nada de claramente imoral, não louve nem aprove nenhum pecado: ainda assim, é preciso perceber que os filmes criticados por Pio XI e Pio XII muitas vezes não continham outras desordens a não ser a maior delas: tudo se passa no enredo como se Deus não existisse. Pode ocorrer que os personagens se vistam modestamente, que haja famílias compostas de pai e mãe e que haja uma certa inocência no enredo; porém, há décadas que os filmes representam a vida em família ou a vida em sociedade como se Deus não existisse. Na maioria dos filmes, os personagens não rezam, não se confessam, não vão à igreja e não procuram agir conforme a consciência porque estão frequentemente mentindo uns aos outros; aliás, mesmo em séries ou filmes para as crianças já existe o louvor da astúcia, das mentirinhas, da vingança nas brincadeiras, da desobediência aos pais, etc. Portanto, mesmo em séries e filmes aparentemente inocentes nós nos acostumamos pouco a pouco que Deus não esteja presente. Infelizmente não nos choca, não nos escandaliza que os personagens não tenham absolutamente nenhuma vida espiritual, e que o sentido da vida seja uma vaga felicidade neste mundo pela posse de algum bem ou pela união a alguma criatura. Se tais séries ou filmes não ofendem a virtude da pureza, sufocam pouco a pouco a virtude da esperança, porque sonhamos com os personagens por uma vida feliz sobre esta terra e desejamos com menor ardor a vida eterna. Quanto mais filmes costumamos assistir teremos menos amor pela oração, menos disposição para aceitar de bom grado os sofrimentos e menos desejo do Céu. Como ensina Pio XI na encíclica Vigilanti cura: “É geralmente sabido o mal enorme que os maus filmes produzem na alma. Por glorificarem o vício e as paixões, são ocasiões de pecado; desviam a mocidade do caminho da virtude; revelam a vida debaixo de um falso prisma; ofuscam e enfraquecem o ideal da perfeição; destroem o amor puro, o respeito devido ao casamento, as íntimas relações do convívio doméstico.”

Todavia, haveria boas séries, bons filmes que os católicos poderiam assistir em paz de consciência? Antes de tudo, é preciso compreender que as séries e os filmes são um absoluto na vida de muitos católicos, simplesmente porque têm medo de não assistir o que o mundo está assistindo. O primeiro passo, caros fiéis, é vencer o respeito humano. Nós não precisamos saber o que se passa nas séries, nas novelas e nos filmes. Nós não precisamos ser escravos dos lançamentos e das novidades. Não podemos dar aos entretenimentos uma importância que eles não merecem. O primeiro passo é reconhecer que nós podemos viver sem assistir a programação da televisão, que até o presente momento já roubou muitas horas de nosso tempo para um entretenimento vazio, quando não pecaminoso. Seria muito louvável se hoje, a partir desta Missa, muitos de nós tomássemos a decisão de não mais assistir à programação da televisão, suas séries e novelas, seus programas fúteis, inúteis e frequentemente escandalosos.

O segundo passo que devemos dar, caros fiéis, é reconhecer que não devemos evitar não apenas as graves cenas contra a virtude da pureza, mas não se expor a nada que atente mesmo remotamente contra a pureza, como declara o exame de consciência dos pecados veniais escrito por Santo Antônio Maria Claret. É por causa do pouco caso que fazemos destas ocasiões, é por causa da curiosidade do mundo que deixamos de progredir a passos largos na via da perfeição. E quem se expõem voluntariamente a ocasiões remotas de impureza, presumindo que não há mal algum, que não cometerá pecado, já se apoia nos seus próprios méritos e deixa de apoiar-se na graça de Deus. Sem a graça não podemos fazer nada de meritório para a eternidade; sem a graça não podemos progredir e santificar-nos; então quem se apoia em si mesmo, presumindo que dará conta de expor-se a certas situações sem cometer pecado já paralisou o progresso da sua alma. É a partir desta paralisia que o demônio poderá fazer pouco a pouco maiores danos à nossa vida espiritual.

O terceiro passo que devemos dar, caros fiéis, é vencer o medo do silêncio e da solidão, que frequentemente obriga tantos católicos a preencher seu tempo com vídeos e mais vídeos no celular. Nós não devemos temer o silêncio e a solidão, porque é no silêncio que Nosso Senhor nos fala ao coração. O vício do celular apenas produz ainda mais frustração, ainda mais angústia, ainda mais tristeza. Em contrapartida, uma boa confissão e uma boa Comunhão recuperarão em nós o amor do silêncio e o gosto pela oração.

Por fim, a conclusão, caros fiéis, é inevitável: são poucas, raras, as boas produções. São raras as produções em que a moral católica não é ofendida e que Nosso Senhor não é o principal ausente. Enquanto tivermos complacência com tantas séries e filmes frívolos, mundanos e mesmo escandalosos, de nada adianta denunciar o globalismo que avança do lado de fora, sendo que o liberalismo já causa tantos estragos do lado de dentro de nossas casas. Tomemos boas resoluções quanto às produções cinematográficas, que frequentemente matam a vida da alma muito antes que qualquer ditador totalitário ameace a vida do corpo.